Versos & Prosas – FAVELA | Por José Antonio
Campos Jardim
Dia 08 de março é dia de comemoração, festa,
reflexão, união e enfrentamento. Supostamente uma data comemorativa. ... Dia da Mulher: Incalculáveis em meio à população, podemos até compará-las às
estrelas do céu, pois são muitas e cada uma contem seu próprio brilho e beleza
particular. Enfim, não medimos esforços e fomos atrás da nossa estrela, Dona Maria.
Na pauta tínhamos em mente relatar uma história real que contemplasse o Dia da Mulher – seria está nossa forma de agradecer as mulheres e por uma homenagear todas. Passamos então a mapear algumas histórias,
algumas visitas e bate papos, lindas histórias escutamos, mas estávamos-nos sobre á
direção do nosso feeling, crendo piamente que quando chegasse o momento encontraríamos. Seguimos nossa
peregrinação por algumas semanas e em alguns momentos cogitamos desistirmos da pauta, pois
corríamos contra o tempo. Nosso objetivo era postar o texto na madrugada do dia 7 para 8 de março. Como previsto não aconteceu, mas enfim, foi bom, conhecemos varias Marias e á Dona Maria Anália
de Moraes – uma senhora simpática de sorriso acolhedor,
calma e tímida; á conhecemos durante o Curso Gestão Social. Dona
Maria falou pouco ao grupo presente, mas observou muito –
para ser mais exato falou só uma única vez quando convidada para se apresentar.
Entre uma explicação e outra do professor e argumentos dos participantes, Ela ouvia
atentamente nos mínimos detalhes e de imediato sussurrava no ouvido da acompanhante Elisangela,
filha.
Fizemos então o convite para conhecê-la,
de imediato com sorrido disse sim. Alguns dias depois estamos nós em sua casa,
recepcionados com café, bolachas e lindas uvas que ela mesma cultiva no fundo
do quintal. Mas, foi em Vitória, interior do Paraná, que a nossa Maria veio ao
mundo, mais uma brasileira vencedora que nasceu para brilhar. De família
humilde, a paranaense Maria Anália de Moraes na adolescência passou por algumas
dificuldades como milhares de jovens no dias de hoje, ela teve que abrir mão dos estudos e da adolescência para ser empregada
doméstica, os recursos ajudavam nas despesa da casa. Não teve os mesmos privilégios das
amigas de adolescência de estudar, brincar, namorar e se engraças com as coisas
belas da vida em meio à calmaria do interior. Hoje, intelectual orgânica, militante comunitária
á presidente de associação sem fins lucrativo, em Curitiba. Instituição que ela mesma
de inicio na varanda de sua casa, nos contou que entre uma viaje e outra em busca de
informações, levou um ano para registrar sua associação (ONG). “Uma coisa tão fácil
de fazer, poderia ser feita em alguns dias, mas, eu só sei ler e escrever o
básico, isto dificulta muito quanto tem que mexer com papelada, mas não
desanimo não, eu vou atrás” afirma.
Algumas guerreiras são forjadas no cerne
das batalhas e Dona Maria é uma dessas, aos 11 anos de idade, ela e aos outros
14 irmãos aprenderam á conviver diariamente com as dificuldades financeiras e a
vida difícil do interior. E no inicio da sua adolescência, etapa intermediária
do desenvolvimento humano, entre a infância e a fase adulta, Dona Maria foi
repentinamente induzida ao amadurecimento ao ser entregue pelo pai ao serviço
doméstico: “Nessa época, quando fui
deixada pelo meu pai nessa casa de família para trabalha, longe de casa eu só
chorava dia e noite de medo de nunca mais voltar para casa ver meus irmãos e meus
pais”. E, assim era e é em alguns casos ainda hoje, tidos como parte da propriedade,
as Marias não decidiam sobre ás suas vidas e corpos, os salários ganhos. Anos
atrás elas não poderiam sequer se matricular em instituições de ensino, os
homens é quem decidiam por elas, os pais, irmãos mais velhos e depois o esposo.
Sobre uma hierarquia exacerbada doentia á sociedade masculina reconheciam atos
truculentos como um dos valores fundamentais da masculinidade, um homem sem rebanho
dominante é um ser sem hombridade, e, em geral, era visto como um “castrado
social”. Antonio, o irmão mais velho compadecido de que sua irmã estava sendo
escravizada e não merecia tal atrocidade, após dozes meses resolveu buscá-la –
“não creditava que ele veio me buscar, o trabalho
era pesado, fui muito humilhada e quando o vi, o Antonio, meu irmão, chorou
muito, mas desta vez foi de alegria, pois sabia que voltaria para casa”.
Em meio ao misto de alegria e responsabilidade
de contribuir financeiramente em seu lar, Dona Maria vivenciava a chance de voltar
ao lar que tanto sonhou nas noites frias, no quarto dos fundos da casa da
patroa. Infelizmente aos 13 anos, novamente forçada ao trabalho em casa de
família para ajudar no sustento familiar, Ela, permanecendo por 18 anos.
Cansadas de ser submetida ao trabalho pesado e horas humilhada, resolveu fugiu de
casa para se casar. Convencida que dias melhores estavam por vir, pois, a vida
em seu lar não fora nada fácil, pai extremamente rígido e autoritário, resolveu
fugir com amor de sua vida, imaginando uma vida melhor, doce engano, algumas
anos se passaram, marido alcoólatra e não demorou muito para começar com
agressões físicas e verbais, foram se tornando cada vez mais frequentes e
intensas, de igual forma á bebedeira. Mas, agora não mais na condição de filha
e sim de mãe, á história se repetia –
e era inaceitável uma mulher independente
dos argumentos, abandonar o casamento. ... Continuei a trabalhar de doméstica, nas
plantações, em empresas de produção sempre para ajudar nas despesas da minha
casa; afirma. E assim se passaram 18 anos deste casamento, convencida que
as agressões do marido á qualquer momento poderia ceifar sua vida, antes de
terminar de criar seus filhos, decidiu separa-se e tentar a vida na cidade grande.
Em Curitiba, tratou de arrumar trabalho para
criar os filhos e voltou á estudar. Passou a dedicar parte do seu tempo á
outras mulheres, na horta comunitária e por 9 anos ouviu histórias. Em 2017,
decidiu criar em sua própria casa o Clube das Mães Felizes na Vila Vitória Régia,
um espaço que vá além das atividades oferecida de macramê, mas um local de
escuta, disponível as mulheres para compartilharem suas alegrias e tristezas. Hoje,
Dona Maria não mais está sob o domínio do outro, não é mais objeto de troca financeira,
destinada à procriação e ao lar e sim, Presidente do Clube de Mães Felizes e o seu
sonho é ver uma comunidade mais unida e melhor para os jovens, crianças e
adultos, afastando-os das drogas e criminalidade através de incentivos ao
primeiro emprego a atividades culturais e esporte e lazer. É necessário falamos
todos os dias e não só nas datas comemorativas sobre as barreiras (simbólicas e
reais), as mulheres não são objetos e não estão conosco neste mundo para fazer
as nossas necessidades. Não podemos admitir que as Marias, sejam proibidas de
sonhar e subdividir sua própria vida entre o presente, passada e futuro.
Obs:
As informações foram obtidas por
meio de entrevista diretamente com a Dona Maria e contribuições de sua filha
Elisangela.
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