VERSOS & PROSAS – FAVELA | Por: José Antonio Campos Jardim
Você é nosso convidado para embarcar em mais uma narrativa real, conhecer parte da história de vida, cultural e pesamento do Rodrigo Berto Sobrinho Pinheiro - Mais conhecido como Mano Cappu - direto de Curitiba.
1-
Quem é o Mano Cappu onde nasceu, cresceu
o que faz e como o Rap entrou na sua vida?
R: Primeiramente
quero agradecer pelo convite do Versos & Prosas e muito progresso pra
noooiz!!
Então, nasci em
Curitiba, porém passei grande parte da minha infância na cidade de Colombo
região metropolitana de Curitiba e por volta dos meus 11 anos de idade, me
mudei para a Cidade Industrial de Curitiba.
O rap entrou na
minha por meio de uma fita k7 que meu primo ganhou do meu tio Nando, o meu tio
nos dizia que era esse som vindo de São Paulo que tava tomando conta da mente
dos muleque e as ideais eram muito loucas. De imediato fomos ouvir a fita k7 do
álbum Sobrevivendo no Inferno do Racionais Mcs a mensagem chegou como um
míssil em minha mente e eu puder ouvir
como o negro e o pobre era tratado no Brasil foi algo cabulozo de ouvir, e pra
ser bem franco era uma mensagem amarga, porém era a verdade nua e crua da real
situação do país, relatada por um mano que vivia aquilo em seu cotidiano
diariamente, e isto era louco por que não era por um viés vindo da política, a
política infelizmente tem o poder de manipular o povo, mas o rap em minha vida
foi como uma lupa que me fez enxergar a real realidade do Brasil, e ele me
proporcionou ver, mas o mais louco foi que hip hop me deu força pra agir e não
ficar apenas de braços cruzados vendo tudo desabar diante dos meus olhos.
2 - Cappu: você teve uma passagem pelo sistema
carcerário – o que mudou (antes e depois) e como vê o sistema no que
desrespeita ressocialização, existe?
R: Sim Zé tive uma
passagem pelo sistema carcerário brasileiro por um crime que não cometi.
Antes do
acontecido eu tinha uma visão distorcida de sistema carcerário, é certo dizer
que o rap ampliou minha visão, no entanto está visão, ficava somente no meu
imaginário, e na mente você sabe, que nós temos o poder de criar o belo e
também de criarmos monstros.
Mas quando passei
de fato por uma prisão, foi meu real choque com a realidade do preso no país,
muitas pessoas acham que a humilhação que o preso passa na cadeia vai
regenera-lo, mas elas estão enganadas, está humilhação e a super lotação de
presídios em todo país, ao meu ver nunca ira resocializar ninguém, ela tem como
intuito mostrar aos demais brasileiros que este é o castigo para as pessoas que
infligiram a lei, ou seja, o governo de forma tirana quer simplesmente causar o
medo na população, querem dizer em poucas palavras “ta vendo se você cometer
um crime vai sofrer como eles”.
No entanto vendo o
lado do detento, o mesmo já vem de uma realidade sofrida e pelo incrível que
parece o sofrimento vivenciado em um presídio não chega nem perto da realidade
que o mesmo vivia e nós sabemos que a realidade de muitos é esmagadora.
Eu defendo
categoricamente a reinserção social que hoje infelizmente é uma fabula em
nossas terras. Vejo que o crime no Brasil só pode ser combatido com a educação,
veja bem, hoje a massa cercaria do país tem um nível educacional baixíssimo,
60% deles não têm o ensino fundamental e 30% não tem o médio concluído, ou
seja, nós estamos falando de 90% da massa carcerária no país não tem educação,
eu não quero entrar na discussão de quem teve ou não acesso a ela, por que
acredito que vivemos em um tempo de solucionar problemas e não apenas de
apontar os erros. Então como eu estava dizendo, nós sabemos que uma grande
parcela dos presos no país não tem educação, vamos agora falar de cursos
profissionalizantes, se não me engano somente 30% de quase 700 mil detentos
recebem curso profissionalizante o restante fica sem nenhuma atividade no
sistema prisional, aí o zé povin gosta de nos dizer que preso fica tudo de
perna pro ar sendo sustentado pelo estado, mas agora eu pergunto, quantas
empresas ou instituições de ensino ligam no DEPEN e oferecem trabalho e
educação para a massa carcerária?
Hoje infelizmente
a grande parte da massa carcerária quando sai da prisão só tem o crime como
escolha, grande parte da sociedade fecha as portas para um ex-detento, e o que
me deixa perplexo é saber que 80% dos brasileiros dizer ter uma religião e toda
religião tem como base o amor ao próximo o perdão, eles vivem falando isto em
seus templos religiosos, mas na pratica não vivem, eles não perdoam os homens
que lhes ofenderam e já pagaram o preço por suas falhas, eles querem que quem
errou pague pelo seu erro dentro e fora da cadeia.
A reinserção não
deve acontecer somente com o preso, ela deve acontecer com os empregadores e
também com a sociedade, não adianta fazer um trabalho somente com o detento se
a sociedade o menospreza e o empregador não vai contrata-lo por que ele tem a
capivara manchada. A reinserção é um trabalho de todos, não apenas do governo,
mas de toda a sociedade.
3 - Quais os
percalços que prejudicam e ao mesmo tempo podem fortalecer o trabalho de um
artista como você?
R: Um dos percalços
que enfrento é que as pessoas acham que eu defendo o preso, e isto não é
verdade, não sou a favor do crime, se o cara cometeu um delito que o mesmo seja
preso e pague pelo seu crime assim como manda a lei, mas a mesma lei que
condena também prevê a reinserção social, a reinserção é o ciclo completo do
cumprimento da lei, se a lei não fecha esse ciclo ela é falha. É o mesmo que um
pai que deixa um filho de castigo, mas não ensina o certo, o filho vai voltar a
erra, por que o pai não ensinou o caminho certo, mas quando o pai deixa de
castigo e ensina o caminho correto ao filho e o mesmo aprende dificilmente ele
vai errar novamente.
Este é dos
percalços que enfrento a falta de compreensão de algumas pessoas, mas eu gosto
deste desafio, eu acredito que isto fortalece ainda mais a minha luta, o reves
que vivencie não foi nada fácil, mas acredito que estou sabendo usa-lo ao meu
favor e hoje quando pego um microfone tenho algo a dizer e é isto que as
pessoas querem ver nos olhos e na voz de um músico confiança, um músico que não
passa isto para os seus ouvintes não vai muito longe, as pessoas sentem a
insegurança.
4 - Maioridade penal no Brasil. Como
você enxerga a discussão? Você é contra (X)
ou a favor ( )?
R: Contra. Sou a
favor de mais escolas, mais centros culturais, mais lazer, mais cursos
profissionalizantes que levem os jovens a sonhar com o futuro. O Brasil é um
país que ama pular etapas de desenvolvimento, eles não dão reinserção, mas
querem prisão perpetua e pena de morte, não dão escola e mas querem maioridade
penal, é inacreditável que idéias assim ganhem força em nosso país. E estas
leis vêm com o intuito de beneficiar somente os ricos imediatistas, eles
envenenam a mente dos brasileiros dizendo que só não estuda que não quer, que tem
tudo para esses jovens hoje, só não faz quem não quer, e isto é mentira, quem
tem tudo são os filhos deles, que tem amplo acesso a boas escolas, cultura,
lazer, cursos e muitas outras coisas. Os jovens da periferia male má tem acesso
ao clube da gente, e o que me preocupa é que o povo pobre acredita nessa
mentira, eles vivem de migalhas e ficam felizes.
Um adolescente não
precisa ficar preso com um adulto, esta é uma medida paliativa que vai causar
um dano gigantesco lá na frente, o que o povo realmente deveria querer é o
descongelamento em 20 anos da educação, isto sim é algo para se lutar. Mas eu
entendo o povo, eles são diariamente manipulados pela mídia, e a mídia esta ali
para servir alguns interesses, interesses que não são os nossos. Eu não estou
afirmando que a mídia mente quando mostra fatos, o problema é que ela só mostra
somente uma parcela dos fatos, ela não mostra a raiz do problema, ela só mostra
o fruto desta arvore problemática, o certo é buscar a raiz desta arvore, não
adianta de nada o trabalho de excluir da sociedade os frutos “podres” se
o problema está na arvore é tempo de nós arrancarmos com raiz e tudo da nossa
nação a arvore chamada corrupção.
5
- Como vocês vê a cena do Rap no Paraná?
R: Bem eu não vou
falar do rap do Paraná até por que eu não dou conta de acompanhar tudo o que
lança de rap no nosso estado, mas posso falar do rap em Curitiba, aqui na city
o rap precisa deixar de ser um movimento de meninos, precisamos consolidar
nosso movimento no rap nacional, e isto não é de hoje, mas parece que não
amadurecemos como músicos, sempre estamos engatinhando, não almejamos lugares
altos, nos contentamos em abrir shows de grupos de fora, não buscamos
fortalecer a nossa cena e muito discurso e pouca ação, se um mano lança um
trampo nem se quer compartilhamos ou deixamos uma simples mensagem no barato, nossas timeline é só “nóis”
e mais ninguém, nossos egos inflaram, parece que a essência da verdadeira
cultura hip hop está nos deixando ou será que ela nunca esteve em nós?
Mas
também não vou ser pessimista em dizer que o rap de cwb está morrendo, mas
creio que estamos passando por uma turbulência e só os fortes vão sobreviver.
6
- Qual o conselho que vocês dariam a um grupo que está começando hoje e quer se
lançar no mercado?
R: Zé, eu me
considero um mano novo no rap saca? Apesar de eu cantar desde dos meus 15 anos
e hoje eu tenho 30, foi em 2014 que comecei a trabalhar sério na música, eu fui
estudar sobre diversas coisas do rap, pra não falar coisa que não deve. E para
os maninhos que querem começar a cantar um bom rap, as palavras que deixo são
compromisso, planejamento e muito persistência Estas três palavras são fáceis
de ler, mas na hora de coloca-las em pratica é um pouco mais difícil. O
compromisso com o rap é o mesmo que você tem quando acorda cedo pra ir trampar,
se você não tiver este compromisso com o seu dom, ele vai por água abaixo, e se
você não tiver um bom planejamento de como vai começar à lançar seu trabalho,
você pode ficar frustrado com os resultados, por exemplo você fez um som muito
louco, mas você não tem um bom planejamento de colocar sua música nas
plataformas digitais, de impulsionar nas redes sociais e tal, simplesmente você
pega o som sobe pro youtube vai no facebook marca você e outras 99 pessoas, se
você faz isso infelizmente você está com péssimo planejamento, primeiro que as
pessoas não gostam de ser marcadas em post e segundo se você quer ser
profissional precisa agir como tal, e por fim você precisa ter persistência,
está é a parte mais difícil de seguir, por que infelizmente temos o péssimo
habito de desistir facilmente dos nossos sonhos, sempre queremos resultados
esplendidos em curto prazo e isto não é assim. Vou dar um exemplo meu, como
disse foi em 2014 que comecei a trampar sério com o rap, e eu tomei a seguinte
estratégia, eu queria ser um cara conhecido nas ruas de Curitiba e por isso foi
atrás de diversos picos cantar, e cantei em tudo que foi canto, não só de
Curitiba mais também da região metropolitana, cantei pra 10 pessoas e também
cantei pra 5000 pessoas, e sempre tive isto comigo, quem não faz 10 pular no
som, dificilmente fará 5000, a quantidade de pessoas que estiver em sua
apresentação jamais pode afetar sua qualidade de música, você precisa sempre
manter ou melhorar o seu padrão de qualidade, ele nunca pode cair só por que
tem menos pessoas, quem disse que essas 10 pessoas são menos importantes que as
5000?
Mas como eu estava
dizendo, eu queria ser um cara conhecido pelas ruas curitibanas, sei que ainda
não alcancei minha meta de forma plena, porém estou na luta, mas a estratégia
que tomei para 2018 foi em o investimento em videoclipes, por que não adiante
você ser Mc de facebook, isto não agrega em nada na sua carreira, você precisa
ser conhecidos pelas ruas, isto sim vai fazer a diferença.
7
- E para fechar o que vocês têm a dizer sobre a política atual e os últimos
episódios?
R: Mano a política
ela me desanima a cada novo episodio infelizmente. E algo que me deixa
frustrado com o hip hop de 2018, é com manos que estão apoiando o Bolsonaro,
eles não conseguem ver que a ideologia dele não se encaixa no viés ideológico
da Cultura Hip Hop, na real eu acredito fielmente que essas pessoas nunca
pertenceram a Cultura Hip Hop, por que o Hip Hop nunca promoveu o massacre as
minorias, ele nunca promoveu o racismo, isto não é Hip Hop, Nunca existiu Hip
Hop de direita.
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